“Tu o dizes, Eu sou Rei”
Pe. David Francisquini
Na atmosfera do Santo Natal de Nosso Senhor
Jesus Cristo, Aquele que dividiu a História em ‘antes’ e ‘depois’; Aquele que
respondeu ao juiz mais infame de toda a História, Pilatos, que Lhe perguntou se
era rei: “tu o dizes; Eu sou Rei; para isto nasci e para isto vim ao
mundo a fim de dar testemunho da verdade; todo aquele que é da verdade, ouve a
minha voz”; Aquele que afirmou que era o “caminho, a verdade e a luz”; o
Homem-Deus quis tornar-se pequeno, pobre, rejeitado, a ponto nascer numa gruta
rodeado de animais, e depois colocado numa manjedoura; tudo isto para ter proporção com os homens que veio
salvar, resgatando-os das trevas do paganismo.
Um aspecto pouco discorrido para quem O contempla
no presépio é o de uma criança frágil, mas cheia de nobreza real, que veio de
fato para reinar, embora seu reino não fosse deste mundo. Depois da figura
central do Menino Jesus, nossos olhos repousam sobre sua Mãe maravilhada, que se
apresenta como verdadeira Rainha. Não como uma rainha-mãe que gerou um filho
que seria rei. Mas a Rainha que gerou o Rei, pois antes de ser gerado já era Rei
do Universo e de todas as criaturas.
Como sabemos pelas Sagradas Escrituras, assim foi
a encarnação do Verbo em Maria: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e
lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e
o Senhor Deus lhe dará o trono de David, seu pai. Ele reinará eternamente sobre
a casa de Jacó, e o seu Reino não terá fim” (Lucas 1,31–33).
Este Menino
que se encontra na manjedoura veio para reinar nas almas e nos corações. Mas, para
que Ele reine, é indispensável a nossa limpeza de coração e retidão de alma, a nossa
prática de sua santa lei e a frequência aos sacramentos.
À luz da Sagrada Escritura, compreendemos que o
reinado de Nosso Senhor Jesus Cristo se estabelece primeiramente no interior
das almas, pois Ele mesmo afirma que “o Reino de Deus está dentro de vós” (Lc
17,20–21); prometendo a presença viva da Trindade, declara que “viremos a Ele e
faremos n’Ele nossa morada” (Jo 14,23).
Já no Antigo Testamento, Deus anunciava essa
obra interior ao dizer: “colocarei minha lei no íntimo deles e a escreverei em
seus corações” (Jr 31,33), e ainda: “dar-vos-ei um coração novo, porei em vós
um espírito novo” (Ez 36,26–27), mostrando que o verdadeiro Reino de Cristo não
é primeiramente exterior ou político, mas espiritual, estabelecido nos corações
que se deixam transformar pela graça.
Ao reinar nos corações, Jesus passa a reinar na
sociedade genuinamente cristã, pavimentada sob a Lei de Deus e os princípios do
Evangelho. O Papa Leão XIII afirmou que tempo houve em que a filosofia do
evangelho reinou entre os povos, tanto nas instituições, na arte, na
literatura, no judiciário, como na própria ordenação do Estado, ocorrendo uma
união pacífica entre o clero e a nobreza.
No livro do Apocalipse está afirmado que Cristo
reina como Rei glorioso, mas esse reinado começa no interior, na fidelidade
perseverante dos fiéis: Ele bate à porta do coração, habita com os seus e
marca-os com o seu Nome. A linguagem é simbólica, repleta de significados, porém
profundamente espiritual, tendente a lançar luz e influência na vida do homem e
nas instituições que compõem a sociedade civil, criando a civilização cristã.
“Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir
a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele
comigo” (Ap 3,20).
Os livros sagrados nos ensinam que a graça de
Deus, ao agir no interior da alma, repercute necessariamente na vida social,
pois “a boca fala do que o coração está cheio” (Mt 12,34), e aquele que foi
iluminado pela graça torna-se “luz do mundo”, chamado a fazer brilhar essa luz
diante dos homens (Mt 5,14–16). Como toda árvore boa produz bons frutos (Mt
7,17–18), a fé viva manifesta-se em obras concretas de caridade e justiça,
lembrando que “a fé, sem as obras, é morta” (Tg 2,17), e assim, à semelhança do
Bom Samaritano (Lc 10,33–34), a graça acolhida no coração transforma não só o
homem interior, mas também a sociedade por meio de ações visíveis de amor ao
próximo.
Assim, devemos contemplar o Natal de Nosso
Senhor Jesus Cristo como verdadeiro marco da civilização cristã. Encontramos na
gruta de Belém uma família privilegiada a guiar-nos como a estrela que guiou os
Reis Magos, rumo à fé, ao bom caminho das virtudes, ao porto seguro de um mundo
que desconhecemos e que está no interior de cada um de nós, que desabrochará em
uma era no Reino de Maria, como Nossa Senhora predisse em Fátima, dizendo que
Ela triunfará sobre essa crise já inexcedível de nossos dias.
Confiemos, pois, que esse Natal seja verdadeiro
motivo de esperança e de confiança no triunfo da Igreja e exaltação da glória
de Deus nas almas. Quem confia, reza; quem reza, luta para alcançar de Deus a
vitória por meio de Maria, ou seja, um novo triunfo sobre as trevas do
neopaganismo. Assim, sob os cuidados da Santíssima Virgem, viveremos melhores
dias, pois se somos verdadeiros filhos, somos seus legítimos herdeiros.



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