quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

“Tu o dizes, Eu sou Rei”

 

“Tu o dizes, Eu sou Rei”

 

Pe. David Francisquini

 


Na atmosfera do Santo Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, Aquele que dividiu a História em ‘antes’ e ‘depois’; Aquele que respondeu ao juiz mais infame de toda a História, Pilatos, que Lhe perguntou se era rei: “tu o dizes; Eu sou Rei; para isto nasci e para isto vim ao mundo a fim de dar testemunho da verdade; todo aquele que é da verdade, ouve a minha voz”; Aquele que afirmou que era o “caminho, a verdade e a luz”; o Homem-Deus quis tornar-se pequeno, pobre, rejeitado, a ponto nascer numa gruta rodeado de animais, e depois colocado numa manjedoura; tudo isto  para ter proporção com os homens que veio salvar, resgatando-os das trevas do paganismo.

Um aspecto pouco discorrido para quem O contempla no presépio é o de uma criança frágil, mas cheia de nobreza real, que veio de fato para reinar, embora seu reino não fosse deste mundo. Depois da figura central do Menino Jesus, nossos olhos repousam sobre sua Mãe maravilhada, que se apresenta como verdadeira Rainha. Não como uma rainha-mãe que gerou um filho que seria rei. Mas a Rainha que gerou o Rei, pois antes de ser gerado já era Rei do Universo e de todas as criaturas.

Como sabemos pelas Sagradas Escrituras, assim foi a encarnação do Verbo em Maria: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de David, seu pai. Ele reinará eternamente sobre a casa de Jacó, e o seu Reino não terá fim” (Lucas 1,31–33).



 Este Menino que se encontra na manjedoura veio para reinar nas almas e nos corações. Mas, para que Ele reine, é indispensável a nossa limpeza de coração e retidão de alma, a nossa prática de sua santa lei e a frequência aos sacramentos.

À luz da Sagrada Escritura, compreendemos que o reinado de Nosso Senhor Jesus Cristo se estabelece primeiramente no interior das almas, pois Ele mesmo afirma que “o Reino de Deus está dentro de vós” (Lc 17,20–21); prometendo a presença viva da Trindade, declara que “viremos a Ele e faremos n’Ele nossa morada” (Jo 14,23).

Já no Antigo Testamento, Deus anunciava essa obra interior ao dizer: “colocarei minha lei no íntimo deles e a escreverei em seus corações” (Jr 31,33), e ainda: “dar-vos-ei um coração novo, porei em vós um espírito novo” (Ez 36,26–27), mostrando que o verdadeiro Reino de Cristo não é primeiramente exterior ou político, mas espiritual, estabelecido nos corações que se deixam transformar pela graça.

Ao reinar nos corações, Jesus passa a reinar na sociedade genuinamente cristã, pavimentada sob a Lei de Deus e os princípios do Evangelho. O Papa Leão XIII afirmou que tempo houve em que a filosofia do evangelho reinou entre os povos, tanto nas instituições, na arte, na literatura, no judiciário, como na própria ordenação do Estado, ocorrendo uma união pacífica entre o clero e a nobreza.

No livro do Apocalipse está afirmado que Cristo reina como Rei glorioso, mas esse reinado começa no interior, na fidelidade perseverante dos fiéis: Ele bate à porta do coração, habita com os seus e marca-os com o seu Nome. A linguagem é simbólica, repleta de significados, porém profundamente espiritual, tendente a lançar luz e influência na vida do homem e nas instituições que compõem a sociedade civil, criando a civilização cristã.

“Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo” (Ap 3,20).

Os livros sagrados nos ensinam que a graça de Deus, ao agir no interior da alma, repercute necessariamente na vida social, pois “a boca fala do que o coração está cheio” (Mt 12,34), e aquele que foi iluminado pela graça torna-se “luz do mundo”, chamado a fazer brilhar essa luz diante dos homens (Mt 5,14–16). Como toda árvore boa produz bons frutos (Mt 7,17–18), a fé viva manifesta-se em obras concretas de caridade e justiça, lembrando que “a fé, sem as obras, é morta” (Tg 2,17), e assim, à semelhança do Bom Samaritano (Lc 10,33–34), a graça acolhida no coração transforma não só o homem interior, mas também a sociedade por meio de ações visíveis de amor ao próximo.

Assim, devemos contemplar o Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo como verdadeiro marco da civilização cristã. Encontramos na gruta de Belém uma família privilegiada a guiar-nos como a estrela que guiou os Reis Magos, rumo à fé, ao bom caminho das virtudes, ao porto seguro de um mundo que desconhecemos e que está no interior de cada um de nós, que desabrochará em uma era no Reino de Maria, como Nossa Senhora predisse em Fátima, dizendo que Ela triunfará sobre essa crise já inexcedível de nossos dias.



Confiemos, pois, que esse Natal seja verdadeiro motivo de esperança e de confiança no triunfo da Igreja e exaltação da glória de Deus nas almas. Quem confia, reza; quem reza, luta para alcançar de Deus a vitória por meio de Maria, ou seja, um novo triunfo sobre as trevas do neopaganismo. Assim, sob os cuidados da Santíssima Virgem, viveremos melhores dias, pois se somos verdadeiros filhos, somos seus legítimos herdeiros.