Inferno:
os tempos mudaram?
*Padre David Francisquini
Imaginemos um teólogo em
cujo espírito germinasse uma ideia nova sobre uma doutrina já consagrada e
sempre ensinada na Igreja Católica, qual seja a da existência do inferno e de
sua eternidade. Era de se supor que ele bem poderia colocar em risco seu futuro
e cair no ostracismo.
Em não longínquo passado o
ex-frei Leonardo Boff foi condenado pela Sagrada Congregação para a Doutrina da
Fé e reduzido ao silêncio por defender erros teológicos. Ele voltou a ensinar o
erro ao afirmar, a respeito de um poeta pernambucano prestes a morrer, que Deus
não condena ninguém para sempre.
Ora, a fé nos assegura que
o fogo do inferno e os tormentos dos condenados são eternos. Não se trata de
opiniões controvertidas entre os teólogos e estudiosos. A eternidade do inferno
é uma verdade de fé que nenhuma autoridade pode mudar — nem sequer o Papa —,
pois está expressa nas próprias Sagradas Escrituras, tanto no Antigo quanto no
Novo Testamento.
As Escrituras opõem-se à
ideia de que o inferno não seja eterno ao afirmar: “Apartai-vos de mim, malditos, para
o fogo eterno” (Mt 25, 41).
De onde se segue que, se o fogo é eterno, também o é o suplício do condenado.
Não haveria razão para Deus ter criado um fogo eterno se não fosse para
castigar eternamente os condenados.
Em outro lugar nas
Escrituras pode-se ler: “Irão
estes para o fogo eterno” (idem
46). “Ir para a geena, para o
fogo inextinguível, onde o seu verme não morre e o fogo não se apaga” (Mc 9, 43 a 44). No Apocalipse 14, 11
está escrito: “A fumaça dos
seus tormentos subirá pelos séculos dos séculos. Não terão descanso algum, nem
de dia nem de noite, esses que adoram a besta e a sua imagem, e todo aquele que
acaso tenha recebido o sinal do seu nome”.
Uma pena que não fosse
eterna — e durasse pouco — faria com que o inferno deixasse de ser inferno e
Deus deixasse de ser Deus. Ao meditar sobre a eternidade do inferno, Santo
Afonso Maria de Ligório nos sugere multiplicar todos os milhões de anos em
infinitas vezes. O resultado dessa multiplicação mostraria que o inferno
estaria apenas começando…
Uma coisa é a bondade de
Deus, que persegue o pecador para convertê-lo, afastá-lo do mau caminho,
concedendo-lhe graças, dons, e até mesmo castigos. Outra coisa é a bondade e a
misericórdia da Igreja, sempre de coração aberto e mãos estendidas para receber
e perdoar o pecador convertido.
Não podemos confundir esse
pecador com aquele que não abandona o seu mau procedimento e morre empedernido.
Se assim viveu e morreu foi por sua própria culpa. Escolheu livre e
espontaneamente o lugar que se chama inferno. Deus dá o prêmio aos bons e o
castigo aos maus.
Como Deus é eterno, também
eternos são o prêmio e o castigo. Deus deixaria de ser Deus se fosse apenas
misericordioso e não desse o prêmio e o castigo de acordo com as obras. Deus é
misericordioso porque justo. Esta eternidade é de fé, porque revelada por
Deus, e não uma simples opinião.
“Apartai-vos de Mim
malditos para o fogo eterno. Irão estes ao suplício eterno. Pagarão a pena da
eterna perdição. Todos serão assolados pelo fogo” (Mt 25, 41. 46; 1Ts1,8; Mc 9,48). Assim como o sal conserva o
alimento, o fogo do inferno atormenta os condenados, mas ao mesmo tempo tem a
propriedade do sal ao conservar-lhes a vida.
“Ali o fogo consome de tal
modo — disse São Bernardo — que
conserva sempre”. Santo Afonso ensina:“O poço não fecha a sua boca,
porque se fechar a abertura em cima, se abrirá em baixo para devorar os
réprobos”. Continua ele: “Enquanto vivo, o pecador
pode ter alguma esperança, mas, se a morte o surpreender em pecado, perderá
toda esperança” (Pr 11,7).
Continua ainda mais:
"Se os condenados pudessem ao menos
embalar-se em alguma enganosa ilusão que aliviasse o seu desespero horrível…
Afinal, um infeliz delinquente condenado à prisão perpétua também procura
alívio em seu pesar, na esperança remota de evadir-se e obter assim a
liberdade.
Mas o condenado não pode sequer ter a ilusão de que um dia poderá
sair de sua prisão! Não, no inferno não há esperança. O desgraçado réprobo terá
sempre diante de si a sentença que o obriga a gemer perpetuamente nesse cárcere
de sofrimentos."
“Uns para a vida eterna, e
outros para o opróbrio que terão sempre diante dos olhos” (Dn 12,2). Para Santo Afonso, o réprobo não sofre somente a pena
de cada instante, mas sofre a cada instante a pena da eternidade.
Eis o que está escrito no
Eclesiastes: “Quando as nuvens
estiverem carregadas, derramarão chuvas sobre a terra. Se a árvore cair para a
parte do meio dia, ou para a do norte, em qualquer lugar onde cair, ficará” (Ecl. 11, 3).
Tal é a sorte do justo e do pecador: ficará para sempre,
no Céu ou no inferno.