Retorno à casa paterna
Pe. David Francisquini
Enquanto o ano de
2017 não começa de verdade, o Brasil assiste a uma onda de criminalidade que
lembra cenas de filmes de terror, tamanha a crueldade e a selvageria cometidas nas
ruas, nos presídios, e até mesmo no recinto familiar.
Neste último, onde
outrora reinava a tranquilidade, a segurança e o bem-estar, com o desfazimento
da família vêm se produzindo desequilíbrios alarmantes, cujo exemplo recente
mais chocante foi a chacina ocorrida no final de 2016 em Campinas, que ceifou a
vida de várias pessoas de uma família, inclusive da esposa e do filho do autor,
que depois pôs fim à sua.
Se medidas drásticas
não forem tomadas, e, sobretudo, se Deus não intervier contra esta brutal
investida, impossível não vislumbrar o caos social.
Entre tais medidas
estaria, de um lado, fazer cessar por vias legais todos os programas
televisivos atentatórios à família e cujo desfecho final próximo ou remoto é o
crime em suas diversas modalidades, e de outro, impedir a legalização das
drogas, defendida até por um ex-presidente octogenário que nega a realidade em
aras ao marxismo que professa: a Holanda, que as legalizou, está voltando
atrás, tais foram os estragos irreparáveis causados pela legalização.
Poderá se perguntar,
no tocante à mídia – televisiva, falada ou escrita – a liberdade de imprensa.
Esta, entretanto, para ser verdadeira e legítima, não pode jamais prejudicar o
bem comum, cuja defesa incumbe ao Estado. A propósito da liberdade ilimitada,
exercida por uns poucos em detrimento do conjunto do País, convém repetir o que
a propósito da Revolução Francesa exclamou Madame Roland: “Liberdade,
liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome!”.
Foi devido a essa liberdade irrestrita e mal
compreendida, cujo porta-voz incessante é a política dos Direitos Humanos, que
gangues de presidiários do crime organizado vêm disseminando o terror em
disputa pelo poder dentro e fora das prisões; que policiais fazem greves, enquanto
outros são agredidos e mortos nas ruas; que se tornou possível a grande
desordem ocorrida em Vitória–ES, com pilhagens, roubos, execuções e conflitos
sangrentos que metem pânico na população ordeira, pacífica e desarmada.
Com efeito, como estamos
longe da paz verdadeira, definida por Santo Agostinho como a tranquilidade da
ordem! Entendida como a paz de Cristo no Reino de Cristo, essa ordem não está
para ser inventada, porquanto ela existiu e está registrada na História, quando
a sociedade destilou e colocou em prática os princípios do Evangelho formando a
civilização cristã no período medieval.
Finda a Cristandade, num
declinar ininterrupto, esta mesma civilização foi sendo carcomida pelos seus
inimigos. Começando pelo tão propalado Renascimento, que substituiu a sociedade
teocêntrica pela antropocêntrica, passando pela Revolução Protestante, quando foram
lançados o espírito de dúvida e o liberalismo religioso, desfechou mais tarde no
assim chamado Século das Luzes, ao mobilizar a razão para combater a verdadeira
fé, depois na Revolução Francesa com a sua doutrina igualitária e laicista, até
chegar ao comunismo.
Como esse processo não
deve ser visto como uma sequência fortuita de causas e efeitos, que se foram
sucedendo de modo inesperado, pois já em seu início continha as energias
necessárias para reduzir a atos todas as suas potencialidades, como afirma
Plinio Corrêa de Oliveira em seu livro Revolução e Contra-Revolução, ele
continua fazendo o seu caminho rumo ao abismo.
Com efeito, uma vez desencadeadas
as más paixões, o homem passa a ter sede de absurdo e de pecado, e assim, de abismo
em abismo, ele segue inexoravelmente a rota da bola de neve ou da pedra que
rola do cimo de uma montanha até o vale mais profundo, incapaz de se lembrar da
casa paterna onde imperavam a harmonia e a paz. Afinal, são poucos os que hoje se
lembram da civilização cristã.
Por que não procurar
reviver aquilo que fazia o homem feliz neste vale de lágrimas? Bons tempos
foram aqueles proclamados pelo Papa Leão XIII: “Tempo houve em que a filosofia
do Evangelho governava as nações”. Havia harmonia entre as classes sociais, pois
todos obedeciam à Lei de Deus, conditio sine qua non para reinar a verdadeira paz
que é a tranquilidade da ordem.
Fala-se tanto de paz...
Aí está a ONU, supostamente a guardiã da paz mundial, mas do que valem seus
esforços? De nada. Absolutamente nada. Há, a respeito dela, até um conceito com
ares de verossimilhança, que se enuncia mais ou menos assim: “ONU = organismo
com o qual ou sem o qual o mundo continua tal e qual”. Afinal, os seus meios
são alheios, quando não diametralmente opostos à Lei de Deus e à sua divina
sabedoria.
Portanto, este grande
desejo de paz vem-se demonstrando inalcançável como a linha do horizonte, sempre
equidistante e nunca atingida pela embarcação em alto mar. Bem considerada a
questão, isto não constitui surpresa, visto que a busca de solução tem sido
feita por meios tortuosos, quando não cúmplices. As discussões costumam girar
em torno das desigualdades, da pobreza, do desemprego, da educação, da saúde.
Mas faz-se, propositadamente,
tábula rasa a respeito daquilo que importa realmente, as questões morais, como
se estas não embasassem fortemente os conceitos e a licitude estabelecida nas
leis. Não esqueçamos que a Santa Igreja é a guardiã da moral, consubstanciada
nos dez mandamentos da Lei de Deus.
* * *
Podemos facilmente constatar
que numa família de prole numerosa, mas carente de recursos, via de regra os
filhos atingem a maioridade vencendo as dificuldades da vida com honra e
dignidade, para a alegria dos pais e edificação da sociedade em que vivem e
servem, constituindo exceção a ocorrência de um deles se tornar infrator ou
criminoso contumaz.
Ora, a imensa maioria
dos brasileiros mostra-se estarrecida com os feitos monstruosos perpetrados
pelas chacinas ocorridas nos presídios e condolente em relação às crianças
trucidadas no ventre materno nas clínicas de aborto e aos idosos que possam vir
a ser objeto da eutanásia. Pois nesses casos há sempre a violação da lei
natural.
Cabe ainda salientar
que, à força de ir sabendo pelo noticiário de tantos e tais acontecimentos, estes
vão se tornando banais, o que mais facilmente induz as pessoas à barbárie. O
que se depreende da narrativa do noticiário sobre as tragédias é que a opinião
pública acaba por se habituar às notícias, não reagindo nem tomando posição diante
dos fatos baseada em princípios. Com tal estado de espírito, o martelar das
notícias torna as pessoas insensíveis.
A noção de bem e de
mal, conatural às pessoas, vai se evanescendo. Encontramo-nos à mercê de um
mundo dominado pela insensibilidade, pelo egoísmo, pela indiferença, pela ausência
crescente de Deus nos corações. O verdadeiro conceito de família como
instituição divina vai assim desaparecendo de nossas mentalidades e
considerações e, com ele o bem-estar, o equilíbrio e a harmonia.
Resta-nos buscar na
oração as forças necessárias para enfrentar esta luta com certeza e esperança
de melhores dias. A doutrina de Jesus Cristo é uma luz que nos guia até a
vitória profetizada em Fátima, há um século, pelo triunfo do Imaculado Coração
de Maria. A Mãe de Deus, embaixadora celeste, disse em 1917 que a Rússia
espalharia seus erros pelo mundo. Pediu oração, penitência, mudança de vida e a
devoção dos cinco primeiros sábados.
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