Santa Missa: um sacrifício sem mácula
*Pe. David
Francisquini
A Santa Missa é a incruenta
renovação do sacrifício do Calvário, ou seja, da Paixão e morte de Nosso Senhor
Jesus Cristo. Foi Ele próprio quem a instituiu na Última Ceia, para que seu
holocausto na Cruz fosse renovado a cada dia em toda a face da Terra, até a
consumação dos séculos.
No momento da Consagração,
as espécies separadas do pão e de vinho nos conduzem ao mistério mais sublime
da nossa santa Fé, ao se transformarem no Corpo e no Sangue de Jesus Cristo.
parte de trás da casula - (paramento litúrgico) |
parte de trás da casula - (paramento litúrgico) |
A separação dessas espécies
indica a morte mística. Os grãos de trigo secados ao sol, debulhados, moídos,
amassados e cozidos ao forno simbolizam um processo no qual a ideia de uma
trituração se encontra subjacente. Quanto às uvas, elas são preparadas e
espremidas no lagar para dar o vinho [na foto ao lado, trigo e uva estilizados
no sacrário]. Este procedimento na preparação do pão e do vinho nos faz
adentrar na dolorosa Paixão de Cristo.
No Calvário houve
derramamento de sangue e no Altar o sacrifício é incruento, mas a Vítima é a
mesma: Jesus Cristo, que se imolou por nós. Pode-se compreender então o ódio
dos inimigos da Fé contra a grande realidade do Altar — o centro da vida cristã
— anunciado pelo profeta Malaquias: “Entre todos os povos, e em todos os
lugares da Terra, do nascer ao pôr-do-sol, oferecer-se-á, à glória de Deus, um
sacrifício sem mácula”.
Com a vinda do nosso divino
Salvador, constituiu-se um vínculo perene entre o Céu e a Terra, pois o
sacerdócio da nova Lei — fundado por Jesus Cristo — passou a ter a missão
superior e grandiosa de oferecer sacrifício pelos pecados do seu povo: “Tu és
sacerdote eternamente segundo a ordem de Melquisedec”. Em toda a Terra, a
qualquer hora do dia, é oferecido o sacrifício puro, sem mancha, santo e
imaculado.
ornamentos da casula |
Não poupou o Altar o
processo revolucionário que se desencadeou contra a Cristandade medieval e cujo
lúgubre curso, agora estertorante, vive seus últimos dias. Já a falsa Reforma
luterana havia mudado a Missa por ser ela o centro de unidade da Igreja,
juntamente com o Papa, sua cabeça visível. Tal reforma procurou extirpar tudo
aquilo que dizia respeito ao sacrifício, à expiação, à impetração e imolação,
ao afirmar que tudo não passava de mera lembrança.
Para a falsa Reforma, não há
simplesmente distinção entre sacerdote e leigo, pois ela nega o caráter
indelével que assinala e distingue o padre do simples fiel. Assim, todos
poderiam oferecer a Missa, a qual não passaria de um ato de louvor, de uma ação
de graças, de uma ceia celebrada com pão e vinho distribuídos de mão em mão a
todos os presentes.
Em sua “missa” celebrada em
língua alemã, Lutero conservou algumas orações sem valor intrínseco, porque
desligadas do verdadeiro sacrifício instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo.
Portanto, o ato mais sublime de nossa Fé, como expressão do sacrifício
latrêutico — ato de reconhecimento e adoração a Deus como Senhor dos senhores
—, foi extirpado pela heresia protestante.
ornamentos da casula |
Como a Santa Missa é o
sacrifício da nova Lei, sua celebração deve revestir-se da mais alta expressão
de nobreza, elevação, dignidade e inocência. Junto ao altar, o celebrante — que
é o sacrificador e representante da Vítima adorável — se eleva acima de toda a
comunidade católica qual novo Monte Calvário, em que a Missa se transforma,
atingindo seu cume no momento da Consagração, quando Cristo se imola.
No sacrifício da nova Lei, o
sacerdote não pode ter esposa nem filhos, por ser um seguidor de Cristo, cuja
Cruz ele traz em suas costas, impressas no paramento [foto abaixo]. Este também
tem um significado, por revestir alguém que vai operar algo de grandioso no
altar onde Cristo se oferece pelos nossos pecados.
Ao se oferecer em holocausto
por toda a humanidade, Jesus Cristo instituiu um sacrifício para os seguidores
de sua Igreja, a única e verdadeira. Os fiéis que assistem a Missa unindo-se às
intenções do sacerdote beneficiam-se dela, pois Cristo morreu para nos dar os
meios de salvação. Se pelo batismo somos incorporados à Igreja como seus
membros vivos, sê-lo-emos a Cristo no Altar por seu sacrifício, seus dons e
oferendas, podendo inclusive, sempre que estivermos em condições, nos unir
intimamente a Ele na sagrada Comunhão.
O mesmo ódio que rondou em
torno do Calvário ronda hoje, em aras da igualdade, em torno do altar. Ele visa
suprimir o verdadeiro sacrifício da Missa com mutilações e supressões para
descaracterizá-lo e torná-lo mais ‘humanista’, mera ceia desprovida do caráter
sagrado. Como o Cânon era recitado em silêncio, ninguém percebeu a modificação
que ele sofreu, por parte de Lutero, suprimindo a ideia de união do sacrifício
com a Santa Igreja.
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O requinte e a beleza do
cerimonial de uma época têm íntima ligação com a mentalidade e os costumes
dessa época, com sua maneira de pensar, sentir e julgar. Se, numa manifestação
de orgulho e sensualidade, lhe forem subtraídos esses predicados, ela decai,
por exemplo, no modo de trajar de seus contemporâneos, que se torna vulgar.
Creio que isso explica de
algum modo o avanço galopante do ateísmo, da laicização e das ideias
revolucionárias que vêm destruindo todos os valores morais e espirituais da
sociedade, como a perda do fervor religioso, da noção de moral e, portanto, do
pecado. O resultado desastroso não poderia ser senão o esvaziamento dos ambientes
católicos.
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(*) Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria –
Cardoso Moreira (RJ).
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