A impiedade sobre um trono
*Pe David Francisquini
Nosso Senhor
Jesus Cristo deu aos seus apóstolos o mandato de anunciar o Evangelho, a fim de
que suas palavras ressoassem pela Terra inteira: "Ide, fazei que todas as
nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do
Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu
estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos" (Mt 28,19-20).
Fortalecidos
com esta missão, os apóstolos "saíram a pregar por toda parte, agindo com
eles o Senhor, e confirmando a Palavra por meio dos sinais que a
acompanhavam" (Mc 16,20). Eles pregavam utilizando-se da linguagem clara e
inequívoca que Jesus Cristo lhes ensinara, e cujas luzes eram destinadas a
perdurar até a consumação dos séculos.
As letras sacras estão permeadas de figuras ricas de significados para descrever o que se passava no coração dos apóstolos: “Em verdade, em verdade vos digo que vos haveis de chorar e gemer enquanto o mundo se alegrará; haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há de converter-se em alegria”. Ao se depararem com a Paixão e Morte de Cristo, a tristeza e a angústia penetraram profundamente nos seus corações; ao ver Cristo ressuscitado, seus corações se converteram em alegria.
A tristeza que
se apoderara do coração dos apóstolos não é ponderável. Para vislumbrá-la,
Nosso Senhor recorre ao exemplo de uma mulher que está para dar à luz. Ela fica
tomada de tristeza em razão do momento difícil, pois chegou sua hora. Mas, após
ter dado à luz, ela já não se recorda de sua anterior aflição, pela alegria de
ter trazido ao mundo uma nova criatura.
Se o exemplo deita
luzes sobre a ressurreição de Cristo – um homem saindo vivo de sua sepultura –,
ele ilumina igualmente a História inteira.
Se em conseqüência
do pecado original a mulher dá à luz em meio às dores do parto, nesta seqüela a
que o pecado de nossos primeiros pais a reduziu nós podemos, entretanto, ver a
figura da Igreja através dos séculos. Quanto sangue, quantas perseguições,
quantas heresias, quantas indiferenças, quantas frivolidades, em suma, quantas
dores teve a Igreja de enfrentar ao longo de sua bimilenar existência!
Tomemos os
nossos dias. Não há lugar do orbe onde não se trame contra a Igreja de Cristo. Costumes
cada vez mais hostis aos Mandamentos de Deus grassam numa sociedade que se
estadeia na luxúria e na opulência de viver, onde praticamente todos vivem privados
da graça e da vida sobrenatural.
Leis ímpias
contrárias à Lei Natural e à Lei Divina vão sendo aprovadas à revelia da
opinião pública, como acaba de acontecer entre nós com a equiparação da união de
pessoas do mesmo sexo com o casamento entre um homem e uma mulher. A aprovação
do aborto de anencéfalos pelo Supremo Tribunal Federal abre as portas para a
matança dos inocentes no ventre materno. Por sua vez, esta mesma lei abre
espaço para a eutanásia...
Se passarmos
para o campo político-social, quantos descalabros! Os leitores devem conhecer
muitos deles. Se acrescermos a isso a crise interna que assola a Santa Igreja,
tisnando a luz, descaracterizando o sal, desedificando a fortaleza para enfrentar
os males que afligem o mundo hodierno, deparamo-nos com uma realidade
profetizada por São Luis Maria Grignion de Montfort em sua Oração Abrasada:
“Vossa fé é transgredida; vosso Evangelho,
desprezado, abandonada vossa religião; torrentes de iniqüidades inundam toda a
terra, e arrastam até os vossos servos; a terra toda está desolada; a impiedade
está sobre um trono; vosso santuário é profanado, e a abominação entrou até no
lugar santo.”
Razão para
perdermos a esperança? – Jamais! Razão, sim, para confiarmos, com ardor sempre
crescente, na promessa feita por Nossa Senhora em Fátima relativa à futura
renovação da Santa Igreja e do mundo: “Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!”.
Eis o encanto
e a alegria que nos aguardam, pois será em meio aos sofrimentos e às dores
atrozes de nossos dias que a Igreja dará à luz a maior e melhor das civilizações
que será o Reino de Maria.