O exorcista
*Pe.
David Francisquini
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jesus liberta um possesso |
Para São Boaventura, a argúcia e a espiritualidade dos
demônios os levam a penetrar nos corpos e neles se fixarem; por sua força
angélica, eles podem atormentá-los, a menos que o impeça um agente superior, ou
seja, um padre exorcista. Adolphe Tanquerey, teólogo francês, assim explica a
ação do demônio sobre os homens:
“Cioso de imitar a ação divina na alma dos santos,
esforça-se o demônio por exercer também o seu império, ou antes, a sua tirania
sobre os homens. Às vezes (...) instala-se no corpo e move-o a seu talante,
como se fosse senhor dele, a fim de lançar a perturbação na alma”. A este
fenômeno se chama possessão.
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Os porcos se lançam nas profundezas do mar, após N.S. ter expulsado o demônio |
O possuído, às vezes se contorce, fala palavrões, se
movimenta como se fosse uma serpente, se debate, quebra tudo ao seu redor, seus
olhos se movimentam desordenadamente, entende a língua latina com perfeição,
exerce uma ação demasiadamente grande, que usa da força que um ser humano é
incapaz. Na residência onde vive ele impõe a desordem e o desequilíbrio.
A sua atuação, na cidade ou na região, é como se fosse
uma cabeça de ponte para as influências malignas, em oposição à ação benfazeja
da Eucaristia no sacrário. Sem dúvida, exerce uma ação diametralmente oposta à
influência sacralizante da Igreja na sociedade.
Isso explica a razão pela qual as tendências, os humores,
os pendores e as inclinações das pessoas da região onde vive o possesso fiquem
mais vulneráveis às tentações e às infestações, bem como à aceitação de certas
ideias, chavões, mentiras, boatos e pecados. Trata-se de uma ação sobre a
opinião pública, criando clima psicológico favorável a atuação dos maus. O
Ritual Romano – livro oficial do cerimonial eclesiástico – explica os sinais
pelos quais se conhece a possessão.
O antídoto eficiente para combatê-la é o exorcismo, feito
em nome de Deus e da Igreja. Ele
não apenas põe em fuga o demônio, devolvendo a
paz à alma, mas abala todo o edifício satânico. A doutrina da ‘comunhão dos
santos’ ensina que há comunicação espiritual entre os membros da Igreja. Por
que não haveria a ‘comunhão dos condenados’?
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São Francisco de Assis no ministério do exorcitato, expulsa os demônios pelas suas virtudes e oração em Arezzo |
Uma figura adequada para retratar esta realidade é a dos
vasos comunicantes. Na comunhão dos santos, uma alma que faça um ato de virtude
potencializa todas as virtudes dos fiéis e dos santos. Na ‘comunhão dos
demônios’, um demônio que se apodera do corpo comunica a sua perfídia a todos
os seus congêneres da terra, dos ares e do inferno.
A possessão de um corpo equivale, portanto, a uma torre
de comando através da qual os demônios exercem a sua ação malfazeja para
destruir a sociedade. Só o exorcista tem o poder de quebrar esta comunicação
entre os demônios e os homens, pois não basta uma simples pregação, um conselho
ou uma admoestação. Isto ajuda, mas não basta.
Pela comunhão dos santos, o exorcista enxota o demônio
com essas palavras: “Conjuro-te diante de Deus e pela autoridade a mim
concedida pela Igreja, retira-te espírito maligno desta pobre criatura, em nome
de Deus Pai, em nome de Deus Filho, em nome de Deus Espírito Santo, em nome da
Santíssima Virgem e de todos os anjos e santos da Corte Celestial, retira-te
espírito maligno e não o apoderes mais”.
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Beato Palau, Exorcista |
Esta ação do sacerdote, investido do poder divino e
agindo em nome da Igreja, obriga o demônio a se retirar. Aparentemente
ignorada, tal ação repercute na Corte celeste, na luta dos bons contra os maus.
Pois se ao vicejar um vício todos os demais vícios ficam motivados e abalam as
virtudes que se lhes são opostas, assim também se passa com a virtude: quando
uma boa ação é praticada, todas as demais se revigoram.
Com efeito, nenhuma ação do homem é indiferente. Ao
deixar o possuído, o demônio se contorce, estertora, lança-se de um lado para o
outro; a estrutura dos demônios fica abalada pelas consequências daquela
derrota. Em contrapartida, os fiéis se sentem fortalecidos nas suas virtudes, e
Deus, Nossa Senhora e a Santa Igreja são glorificados.