As armas contra o
demônio
Pe. David Francisquini
Ao nos
depararmos com uma montanha, tendemos primeiro a admirá-la. Em seguida
arquitetamos um modo de escalar suas encostas e visitar seu cume. Por fim, tendo-a
como pedestal, contemplamos os vastos cenários que a rodeiam, símbolos de
valores transcendentais.
O nosso peregrinar pela Terra pode ser comparado
a um rio que nasce numa montanha dessas, percorre vales, perde-se em meio a uma
vegetação que lhe é hostil, se precipita despenhadeiro abaixo, reaparece risonho
em prado verdejante, atravessa ainda região de espinhos e abrolhos antes de
chegar vitorioso ao mar. Se pudessem, suas águas exclamariam: “vitória”!
A vida do homem neste Vale de Lágrimas é cheia
de riscos, exigindo dele espírito de combatividade e de luta. Maculado pelo
pecado original, o ser humano tem tendências quase inexplicáveis que o impedem
de avançar por suas próprias forças rumo ao cume da montanha. Os Mandamentos divinos se lhe apresentam de
árdua observância, devido às tentações e à debilidade de sua natureza decaída.
Se considerarmos
que uma terra ressequida termina cedendo às constantes chuvas e tornando-se
capaz de fazer germinar a semente lançada pelo homem, não sem razão devemos
figurar Deus como pai a velar pelos seus filhos. Ao nos criar à sua imagem e semelhança, Ele
colocou sobre nós as melhores de suas complacências.
A graça de
Deus que nunca nos falta pode o que a natureza não poderia. Tentações nos
sobrevêm, mas ninguém é tentado acima de suas próprias forças. Nos momentos
difíceis, devemos sempre recorrer a Deus e fazermos uso dos tesouros que a
Igreja coloca à disposição dos fiéis, através da mediação de Maria Santíssima,
Mãe de Deus e nossa mãe.
O demônio, ao
perceber que a alma regenerada na pia batismal se fortalece com as virtudes,
não a deixa em paz. Contudo, não podemos nos turbar com as provas, pois Deus
nos deu todas as armas para vencê-las. Como o maligno não fica ocioso e ronda como
um leão faminto querendo nos devorar, Deus nos cumula de graças. Sua ação benfazeja
nos mune para o combate.
Devemos – com o coração humilde – nos apoiar
no fortíssimo braço de Deus, e, assim amparados, travarmos o embate com aquele
que vagueia pelo mundo para perder as almas. E Deus nos dará a vitória, pois tal
luta está ancorada na oração constante, na vigilância, no jejum e na
abstinência.
Com este
estado de alma, podemos ser comparados a uma majestosa montanha a convidar nossos
semelhantes a galgar seu cume, habitat das almas generosas e que realmente amam
a Deus. A liturgia da Quaresma nos apresenta no seu primeiro domingo o sermão
da tentação de Jesus, para nos oferecer os meios de vencer o espírito maligno e
contemplar um dia a Deus face a face no Céu, como Cristo diante dos apóstolos
transfigurado no monte Tabor.
Jesus
quis ficar sozinho no deserto e ser tentado para nos ensinar a combater o
inimigo. A Tradição afirma que naquela região deserta entre Jericó e Jerusalém
– onde os ladrões perambulavam para roubar, saquear e matar – Adão foi
derrotado pelo demônio. Mas que foi também ali que Jesus Cristo, o novo Adão, quis
ir para vencer o espírito das trevas e consumar depois a Redenção com a morte
de Cruz.