A Igreja crê o que
ela reza e reza o que ela crê
*Padre
David Francisquini
Nos
idos de 1950, ainda muito criança, todo lampeiro, ia aos domingos com meus pais
assistir ao santo sacrifício da missa. Durante a celebração ficava observando
os movimentos do sacerdote no altar, as formas e as cores dos paramentos
litúrgicos, os cantos, além dos fiéis que, recolhidos, uniam suas intenções às
do celebrante.
Não
entendia grande coisa do que ali se passava, mas podia perceber que algo de
muito transcendente se operava naquele culto prestado a Deus. Ao voltar para
casa, juntos com os meus irmãos, num clima tão sério quanto o permitia nossa
idade, sob os olhares comprazidos dos pais, porfiava com eles em imitar as
palavras e os gestos do padre, à guisa de também “celebrar” a missa.
Alguma
coisa de imponderável daquele ritual se prolongava em nossos espíritos, a ponto
de o querermos alegremente imitar. Mesmo sendo em latim, por ser bem ordenado,
sem pressa, e ao som de músicas e cantos que elevavam os corações a Deus,
concorria para a atuação da graça divina em nós, alimentando a fé e o amor à
verdadeira Igreja de Jesus Cristo.
Tratava-se
da missa de sempre, hoje incompreensivelmente muito combatida e perseguida, por
bispos e até mesmo por altos escalões da Igreja. É chamada ‘tridentina’ para
diferenciar da nova missa instituída por Paulo VI em 1969. Foi a Missa a que
assisti sempre, até me ordenar sacerdote em 1974. Por fidelidade à Santa Missa
e aos ensinamentos emanados do Magistério da Igreja, tive de procurar
seminários, um após outro, para me manter fiel à tradição.
Ao
entrar no seminário, antes mesmo da realização do Concílio Vaticano II, a Missa
tridentina era aquela que encantava todos nós, desejosos de um dia poder
celebrar os mistérios divinos da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Perseguido com outros colegas de seminário, eu acabei parando em Campos, onde
permaneci como sacerdote que sempre só celebrou a Missa tridentina.
Por
que “Missa tridentina”? Foi e continua
sendo a missa que sempre gozou de cidadania na Santa Igreja. Ela atingiu seu
apogeu no Concílio de Trento (1545-1563), que teve como objetivo tomar posições
referentes às críticas dos reformistas protestantes, além de unificar o culto
católico, expurgando os abusos litúrgicos e doutrinários que ensejaram a
rebelião de Lutero.
Esse
concílio se deveu antes de tudo à preocupação dos Padres conciliares em
combater, defender e explicitar a doutrina da Igreja para se premunirem da
ameaça do luteranismo.
Na
verdade, a reação aos abusos e à decadência religiosa da Renascença veio do
Concílio de Trento, que contrapôs os golpes dos luteranos com a unificação da
liturgia católica, relacionando o crer com aquilo que se reza, traduzido na
máxima lex orandi lex credendi, ou seja, que a norma da oração estabeleça a
norma da fé. A Igreja crê o que ela reza e celebra ou reza o que ela crê.
Afinal,
o zelo que remonta à tradição deve nos afastar de todo o prurido de novidades
que grassa no mundo moderno, para darmos assim continuidade à Igreja por todos
os séculos dos séculos. O tema da Santa Missa – a renovação incruenta do santo
sacrifício do Calvário – não poderia ser mais excelso, e os tempos decadentes
de hoje bradam aos céus por desagravo.
Brademos
com Elias Profeta: “Zelo zelatus sum pro Domino Deo Exercituum”, 1 Reis, XIX,
1, ou seja, eu me consumo de zelo pelo Senhor Deus dos Exércitos.
Espero
poder voltar ao tema.
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